terça-feira, 15 de dezembro de 2009






Por que te amo

Te amo
te amo de uma maneira inexplicável
de uma forma inconfessável
de um modo contraditório
Te amo
Te amo , com meus estados de ânimo que são muitos
e mudar de humor continuadamente
pelo que você já sabe


o tempo
a vida
a morte

Te amo
Te amo, com o mundo que não entendo
com as pessoas que não compreendem
com a ambivalência de minha alma
com a incoerência dos meus atos
com a fatalidade do destino
com a conspiração do desejo
com a ambigüidade dos fatos
ainda quando digo que não te amo, te amo
até quando te engano, não te engano
no fundo levo a cabo um plano
para amar-te melhor.

Te amo
Te amo , sem refletir, inconscientemente
irresponsavelmente, espontaneamente
involuntariamente, por instinto
por impulso, irracionalmente
de fato não tenho argumentos lógicos
nem sequer improvisados
para fundamentar este amor que sinto por ti
que surgiu misteriosamente do nada
que não resolveu magicamente nada
e que milagrosamente, pouco a pouco, com pouco e nada,
melhorou o pior de mim

Te amo
Te amo com um corpo que não pensa
com um coração que não raciocina
com uma cabeça que não coordena

Te amo
Te amo incompreensivelmente
sem perguntar-me porque te amo
sem importar-me porque te amo
sem questionar-me porque te amo

Te amo
simplesmente porque te amo
eu mesmo não sei porque te amo


(Anjo Chris).

Canção na plenitude





Não tenho mais os olhos de menina
nem corpo adolescente, e a pele
translúcida há muito se manchou.
Há rugas onde havia sedas, sou uma estrutura
agrandada pelos anos e o peso dos fardos
bons ou ruins.
(Carreguei muitos com gosto e alguns com rebeldia.)

O que te posso dar é mais que tudo
o que perdi: dou-te os meus ganhos.
A maturidade que consegue rir
quando em outros tempos choraria,
busca te agradar
quando antigamente quereria
apenas ser amada.
Posso dar-te muito mais do que beleza
e juventude agora: esses dourados anos
me ensinaram a amar melhor, com mais paciência
e não menos ardor, a entender-te
se precisas, a aguardar-te quando vais,
a dar-te regaço de amante e colo de amiga,
e sobretudo força — que vem do aprendizado.
Isso posso te dar: um mar antigo e confiável
cujas marés — mesmo se fogem — retornam,
cujas correntes ocultas não levam destroços
mas o sonho interminável das sereias.



(Lya Luft)


O texto acima foi extraído do livro "Secreta Mirada", Editora Mandarim - São Paulo, 1997, pág. 151.

Mulheres Possíveis






'Eu não sirvo de exemplo para nada, mas, se você
quer saber se isso é
possível, me ofereço como piloto de testes. Sou a
Miss Imperfeita, muito
prazer. A imperfeita que faz tudo o que precisa fazer,
como boa
profissional, mãe, filha e mulher que também sou:
trabalho todos os dias,
ganho minha grana, vou ao supermercado, decido o
cardápio das refeições,
cuido dos filhos, marido (se tiver), telefono sempre
para minha mãe, procuro
minhas amigas, namoro, viajo, vou ao cinema, pago
minhas contas, respondo a
toneladas de e mails, faço revisões no dentista,
 mamografia, caminho meia
hora diariamente, compro flores para casa, providencio
os consertos
domésticos e ainda faço as unhas e depilação!

E, entre uma coisa e outra,
leio livros.

Portanto, sou ocupada, mas não uma workholic.

Por mais disciplinada e responsável que eu seja,
aprendi duas coisinhas
que operam milagres.

Primeiro: a dizer NÃO..


Segundo: a não sentir um pingo de culpa por dizer
NÃO. Culpa por nada,
aliás.

Existe a Coca Zero, o Fome Zero, o Recruta Zero. Pois
inclua na sua
lista a Culpa Zero.

Quando você nasceu, nenhum profeta adentrou a sala da
maternidade e lhe
apontou o dedo dizendo que a partir daquele momento
você seria modelo para
os outros.

Seu pai e sua mãe, acredite, não tiveram essa
expectativa: tudo o que
desejaram é que você não chorasse muito durante as
madrugadas e mamasse
direitinho.

Você não é Nossa Senhora.

Você é, humildemente, uma mulher.

E, se não
aprender a delegar, a priorizar e a se divertir, bye-bye
vida
interessante. Porque vida interessante não é ter a
agenda lotada, não é ser
sempre politicamente correta, não é topar qualquer
projeto por dinheiro, não
é atender a todos e criar para si a falsa impressão
de ser indispensável. É
ter tempo.

Tempo para fazer nada.

Tempo para fazer tudo.

Tempo para dançar sozinha na sala.

Tempo para bisbilhotar uma loja de discos.

Tempo para sumir dois dias com seu amor.

Três dias.

Cinco dias!

Tempo para uma massagem.

Tempo para ver a novela.

Tempo para receber aquela sua amiga que é consultora
de produtos de
beleza.

Tempo para fazer um trabalho voluntário.

Tempo para procurar um abajur novo para seu
quarto.

Tempo para conhecer outras pessoas.

Voltar a estudar.


Para engravidar.

Tempo para escrever um livro que você nem sabe se um
dia será editado.

Tempo, principalmente, para descobrir que você pode
ser perfeitamente
organizada e profissional sem deixar de existir.

Porque nossa existência não é contabilizada por um
relógio de ponto ou
pela quantidade de memorandos virtuais que atolam
nossa caixa postal.

Existir, a que será que se destina?

Destina-se a ter o tempo a favor, e não contra..

A mulher moderna anda muito antiga. Acredita que, se
não for super, se
não for mega, se não for uma executiva ISO 9000,
não será bem avaliada. Está
tentando provar não-sei-o-quê para não-sei-quem.

Precisa respeitar o mosaico de si mesma, privilegiar
cada pedacinho de
si.

Se o trabalho é um pedação de sua vida, ótimo!


Nada é mais elegante, charmoso e inteligente do que
ser independente.
Mulher que se sustenta fica muito mais sexy e muito
mais livre para ir
e vir.. Desde que lembre de separar alguns bons
> > momentos da semana para
> > > usufruir essa independência, senão é escravidão, a
mesma que nos mantinha
trancafiadas em casa, espiando a vida pela janela.

Desacelerar tem um custo. Talvez seja preciso esquecer
a bolsa Prada, o
hotel decorado pelo Philippe Starck e o batom da
M.A.C.
Mas, se você precisa vender a alma ao diabo para ter
tudo isso,
francamente, está precisando rever seus valores.

E descobrir que uma bolsa de palha, uma pousadinha
rústica à beira-mar
e o rosto lavado (ok, esqueça o rosto lavado) podem
ser prazeres cinco
estrelas e nos
dar uma nova perspectiva sobre o que é, afinal, uma vida
interessante'

(Martha Medeiros)


Obs.: Texto na Revista do Jornal O Globo.