sábado, 22 de maio de 2010

Caminhos e descaminhos



Para chegar aonde cheguei é preciso caminhar, pisar descalça no chão até ferir o pé (...), furar a sola com espinhos, fazer bolhas, criar calos; nunca calar; calar, não calo! Cantar chorando, dizer versos ao inverso, ser repentista de repente, ter um olhar no infinito e ir além... (Do horizonte). Rasgar a mata com dor, ouvir o lamento dos galhos que a foice corta sem dó. Ter no peito, em vez de rosário, um trançado de "nós". É preciso, além de tudo, viver a vida urgente, antes que o tempo chegue, a boca cale e os olhos silenciem a prece. Para chegar onde cheguei, minha tristeza deixei esquecida nalgum lugar. Segui trilhas solitárias, sem medo, esta navalha acariciei. Fiz de tudo, ainda faço, para viver neste regaço, onde a dor é o rouxinol e o labirinto trançado. Para pisar o que pisei, nem precisa ter chão, porque borboleta voa... Para pisar onde quis ir, fui até onde não pude. Ficar é que não fiquei.

Para chegar onde cheguei, subi montes, desci serras; fui ao pó, estive no inferno; comi o pão que o diabo não tocou, fiz da dor minha alegria; semeei neste deserto as sementes do querer, reguei com lágrimas todas para vê-las florescer. Os meus dias foram noites, noites sem boemia, sem encanto, luar sem poesia, carnaval sem fantasia. Para chegar aonde estou, morri e nasci para o amor e que ninguém me pergunte o que é ser como sou.

(Ednar Andrade).