sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Sem medo da solidão



“Solidão não é o vazio de gente ao nosso lado... Isto é circunstância. Solidão é muito mais do que isto.  Solidão é quando nos perdemos de nós mesmos e procuramos em vão pela nossa alma...” 


(Francisco Buarque de Holanda).


Verdade. E já me senti assim, solidão é isto sim... "Graças ao sofrimento e a dor, hoje não sinto solidão". Tenho-me ao meu lado, carrego comigo minhas experiências e tudo enfim que me faz ter grande companheira: minha maturidade, a ausência dos medos...

Não é que eu tenha ficado egoísta, eu só aprendi a me amar, e ter-me como uma verdadeira presença que toco, sei seu verdadeiro nome e não me abandona jamais... Nem deixo que a vaidade me alimente.

Seu nome: realidade, companheira que deveria ser inseparável a qualquer um e é, mas em certos momentos da vida, no auge da mocidade, nós a tememos e não a vemos com a cara que realmente tem; olhando para ela, como que com mágoa, assim pensando, sê-la uma inimiga, simplesmente porque bom é substituir ou maquiar algo, que alguns chamam de destino, e eu de escolha.

Escolha... A escolha é a chave sem cópia do destino que ninguém fabrica, além de nós. É livre o direito, a opção de “sofrermos ou de sermos felizes”. Ninguém há que tenha tamanha capacidade de fazer feliz o outro. Esta consciência é o que nos liberta, é o que nos faz ver que podemos ter pessoas, conviver com elas, mas sempre estaremos sós, o que é muito bom. A nossa mente não pode sofrer a influência do medo de estar consigo. É confortável saber-se dono do seu sentimento, quando há, na mocidade, uma terrível e romântica ilusão de sermos um do outro ou, assim, como ser o outro.

Também é verdade que não se pode ser feliz sozinho. Compartilhar o riso, as alegrias, é fundamental ou o riso seria insípido, idiota, louco. Também é indispensável, a pessoa confidente, “o beijo depois do café (Roberto Carlos)”... Rsrs... Todos têm razão. Mas, quantos tomam café juntos, dividem a cama, dividem o prazer e continuam sós? E fica aí provado que mesmo estando acompanhados, podemos estar sós.

Recebi hoje, de uma amiga, um e-mail contendo o texto do Chico Buarque, já citado acima, onde o mesmo descreve com prosa e graça o tema: solidão e pus-me a pensar em como é maravilhoso não mais carecer de companhia(s) para fugir da solidão.

Isso já foi como doença e continua sendo, não para mim. Mas, como um todo, ninguém está isento deste primário sentimento. O que vale, ou o que pode valer, é estar apenas acompanhado? Se tantas vezes podemos continuar sós em meio ao tumulto ou quantas vezes perdemos o prazer de sorver, de viver momentos de ímpar sabedoria por insegurança ou disfarçado desejo de posse.

E o que é perder-se da alma? Na minha visão, perdemos-nos da alma quando a fantasia faz-se maior que a realidade. A vida não é complicada, viver é simples, tão simples quanto respirar. E se não respiramos direito, da forma como devemos ou como deveríamos, aí sim, buscamos na alma do periférico e não na nossa a essência da companhia. Não, não sou egocêntrica, mas defendo que só me encontrei, quando fiquei de frente comigo. E que é maravilhoso estar com os amigos, ter como é verdadeiramente poucos nomes para chamar de amigos e ter a certeza de que para ser feliz o homem precisa nascer feliz. É algo que defendo e digo: você é ou não feliz. E quando o homem é feliz, está feliz, não tem medo deste monstro: solidão.



Isto é bom... Me dá certezas, e razão para seguir sem fantasmas. 

(Ednar Andrade).

Noturno



Insônia...
E essa droga de dia
Que não raia!
Ao longe ouço um carro,
Quebrando o silêncio da cidade
Que dorme, cansada, fatigada...
E preguiçosa.
Somente meu cérebro,
Nesta madrugada,
É quem continua o trabalho
Estafante e incessante de pensar.
Penso em tudo...
Trabalho, relacionamento, futuro...
O preço do pão e a origem do universo.
As horas avançam
Sem minha avença.
O tempo não pára
Para ninguém.
A calmaria das horas
E o negrume da noite
Aliada aos silêncios das coisas
Não são suficientes para dobrar-me
O cérebro e fechar-me os olhos,
Os quais, olho no espelho,
E já os vejo vermelhos.
O tempo não pára,
As horas avançam,
Mas o dia não raia.
Segue, lenta e sem-vontade, a vida...
E como esta madrugada,
Continua, para uns, sem que o Sol brilhe.

(Danclads Lins de Andrade).