quarta-feira, 27 de abril de 2016

Imperfeito


Perfeito,
Palavra humana,
Que o meu olhar imperfeito
Não consegue perfeito mirar

Perfeito o que é ou será?
Poderia o homem, assim, perfeito
Nascer e belo florescer
E depois…

Perfeito, descansar.

… Mas o que vejo e o que sinto
É tão imperfeito
Que nada há perfeito
Pra morar neste imperfeito peito

Poderia haver uma estrada
Onde o homem com seus passos imperfeitos
Pudesse parar
E ali postar-se-ia perfeito
Com todos os seus imperfeitos,
Descansar.

(Ednar Andradce).


Obscuro



…Então do Alto e fedido cabelo e barba o moço bradou: terra à vista!!!! …

Neste Alegre dia tudo começou, tudo ficou triste e obscuro, será que também chovia?
!!!!!!!!!!!
!!!!!!!
!!!!
!!
!
!

…E o povo carrega consigo esperanças… (??? ) Não creio num país que era verdura e hoje cinza. Esta aquarela desbotada deixa confusa a visão dos que “criam ou creem”. Nada mudou, exceto o timão que mudou de mão e seguirá desgovernado e deriva numa desenfreada queda e isto acontece e acontecerá sem que haja …….”impedimento”.

…Mas como me disse um grande amigo: “Bom dia. Tudo acabará bem. O mundo não acaba hoje. rs A vida seguirá em frente. Abraço”.

(Ednar Andrade).

Muito a agradecer



… A luta é árdua, as lágrimas às vezes rolam descontroladas. 2015 foi para mim um ano difícil, sinto-me cansada, mudada, olhando tudo com um olhar de interrogação, jamais serei a mesma ..

Não posso negar que há uma estrada sinuosa e cheia de sombras nesta minha jornada.

A palavra “Alzheimer” é um monstro impiedoso que devasta e arrasta a quem amamos. Quem já viveu este assombroso tormento sabe do que falo.

Desisti de tudo, esqueci-me, exilei-me nesta dor, abracei o amor pela minha mãe a quem jamais deixarei e irei com ela até o fim.

Aos amigos quero agradecer a solidariedade que tem tido para conosco, o carinho e a atenção que muitos tem demonstrado. Agradeço de coração as mensagens, as curtidas, os comentários meigos, enfim.

Deixo aqui claro que isto pode acontecer a qualquer um, em qualquer lar feliz. Que ninguém precise passar por tanta dor, pois é realmente cruel e fria esta doença.

Cá estamos numa guerra desigual entre a vontade de vencer e a realidade brutal desta doença.

…Mesmo assim, sinto-me feliz e agradeço por está terminando mais um ano com a alegria dos poucos sorrisos que dela consigo roubar, pelo gesto de abrir os olhos numa tentativa difícil de me entender a voz, isto é tudo que ela consegue dizer-me. abrir os olhos cegos e esboçar um sorriso que parece uma festa para mim.

Agradecida estou porque ainda a tenho no meu abraço e em cada amanhecer, mesmo sendo este um calendário incerto.

A vida me deixou tonta e trouxe um crescimento inevitável. Também. Não sou de desistir. Sou frágil, mas o amor me faz forte.
Feliz 2016 queridos amigos. Saúde e paz…

(Ednar Andrade).

Ignis


De Mendeleev
A Shakespeare
Todos contorciam-se
Na fogueira.
Era uma fogueira santa, sábia.
Queimavam números,
Ardiam personagens.
Uma dança de fumaça e pó.
As labaredas comiam os cálculos,
Os versos, as rimas, sem que nada
Ou ninguém pudesse salvá-los da sorte.
Da biblioteca ao fogo,
Da estante aos destroços,
Migraram, como o homem,
Para o seu instante letal.


(Ednar Andrade).

Morte


Tenho uma relação de afeto
Com a morte.
Ela me visita
A todo instante.

Passeia no meu sangue,
Mede meu ar,
Meu ser,
Meu ter,
Meu eu.

Ela invade meu quarto,
A sala,
Os escombros,
Os jardins,
Mora dentro e fora
De mim.

Lambe quem abraço,
Quer beijar
Quem beijo.
Sussurra,
Faz versos,
Finjo que não vejo.

Ela é forte;
Eu fraca.
Luto, mas não creio
Que não haja vida
Que não seja morte.


(Ednar Andrade).

Instante


Não faz tanto tempo, ela feliz sorria, dizendo loas, cantigas santas: uma menina sempre…

…A noite amanhece e sempre, ou quase sempre, nada é diferente, exceto o meu olhar cansado que fica cada vez mais noturno e sem solar luz. …

Vejo através das grades da minha prisão domiciliar, onde o meu exílio mora. O meu amor também escorre feito leito de rio e se esvai sem precisar exatamente dizer-me com palavras: “adeus”

Madrugadas sonolentas e frias são um eterno estado de torpor e medo.

A descrença da carne é cruel, o desalinho dos sonhos um temporal de interrogações e de palavras que me fazem desconfiar das muitas convicções, o amor me é real neste despencar do calendário, silenciosamente me adentro e quase nada encontro do que antes pensava haver, a certeza da mais triste visão varre de mim a vontade de sorrir. Minha boca tem um fel que me faz companhia, somente o barulho dos motores dos carros apressados dá-me a noção de que a vida lá fora tem movimento e sons.

Cá de dentro da minha dor, ouço mantras de agonias, ouço pausas nos calados segredos das horas e penso, penso em tudo que adormece em meu ser, enquanto num gesto de conformação e de constatação nunca acordo; levanto-me apenas, entendo que o fim permeia o instante . E ela parte a cada novo dia, e me deixa cada dia mais só.

Há uma semelhança no que vivo neste eternal e bisonho, com a maternidade: toda mulher é feliz por carregar no ventre vida; mesmo sabendo que nada sabe do assombroso instante da explosão do nascimento.

…E lembrando Cristo na sua angustia e medo da morte dizia ao pai: senhor se possível afasta de mim este cálice. Assim também eu temo aquele instante em que verei seu último suspiro.

Há um coquetel de amor e de pavor na maternidade em seu final, assim como na espera da hora em que se aproxima com passos lentos e sutis a morte de um grande imensurável ser que tanto amamos.

Olhando para o leito, como quem olha para a cruz, vejo uma vida em torturado sacrifício morrendo sem glórias, sem louros, sem honras, lembro-me de Jesus, que por todos deu a vida assim crucificado, braços estendidos mãos e pés atados, sofrendo sangrando. Sagrado.

E nas vírgulas das noites, e nas reticências das tardes, inda lembro seu sorriso que mora no ponto final deste nosso amor sagrado.

Sagrado seja este olhar que já não fita o meu cansado, sagradas sejam suas mãos, enrugadas, trêmulas e quentes, sagradas sejam as carícias que delas sinto ao roçar a pele frágil entre os dedos encrespados de dor, são mãos mortas são, sem gestos, sem pecados, bendito seja eterno, este amor tão lindo que me deu toda vida, assim rezo.

O amor é a força que faz forte um homem cansado. O amor é o infinito sentido do que ainda resta, uma linha curva com reta final ao silenciar de tudo.

(Ednar Andrade).



Vida


…Mas a vida,
a vida é uma engrenagem falha.*


(Ednar Andrade).

Livre


Voou para o infinito
Um pássaro aflito,
Fugiu da prisão.

Voou, bateu asas,
Deixando a saudade
Nos corações.

Pássaro alegre
Cantava.
Cantava chorando,
Chorando, cantava.

Vai pássaro alegre,
Vai para o infinito.
Teu medo, teu grito,
Deixastes também

Agora só cantas
Com os anjos no céu.
Sem dor, sem sofrer,
És livre, então.

02/11/2015*


(Ednar Andrade).

Tolices


Eu dizia coisas que não sei mais dizer.
Acreditava em sentimentos
Que hoje chamo de tolices.
Amava com um jeito absurdo e inocente.
Chorava quando era pra cantar.

Algumas coisas tristes,
Guarda-se na memória
De forma inevitável
E viva, como um vídeo-teipe.

Eu queria como quer uma criança,
O doce da vitrine ou a boneca mais linda,
A felicidade inexistente.
Chorava de emoção ao ouvir

Uma canção de amor
E pensava na vida como quem pensa
Num bosque…
Vivia a primavera como quem faz um poema

E beijava como um beija-flor,
Sugando da vida o néctar.
Um barquinho visto de longe,
Era como uma embarcação

Cheia de sonhos.
Aí, a vida chega, o tempo passa
E o que resta da festa
É o que a ninguém basta.

(03.08.2011).

(Ednar Andrade).


Nada é igual*


Aquilo fazia parte natural de um cenário vivo.

Cada centímetro de memória brota ainda nos finais de tarde, como um azulejo, na parede do quintal, os minutos espreitam a hora mais suave da Ave Maria*

O Sol parecia nos convidar para uma festa, acompanhados pela passarada, ouviam-se todos os cantos.

Do bem-te-vi ao rouxinol, uma festa ardia, numa melódica canção de pi, pi, pis… Uma algazarra rotineira, por toda parte. Aguardo a noite, que logo virá como nos romances entre folhas secas e florais em sépia.

Sentados como parte da paisagem, olhando em volta os pequenos ruídos e murmúrios das águas da lagoa, observávamos a natureza sabiamente pintando o céu em tons de azul e vermelho, tingindo de outonais cores e brilhos, o anoitecer.…………….

Respiro, sentindo na boca um sabor delicioso de pitangas maduras. As cercas são feitas de avelós, não existem portas, nem trancas em nenhuma parte.

Tudo é tão simples, tudo tão sereno, a mata vai silenciando e trazendo, no vento, um cheiro doce das mangabas caídas entre as folhas cor de sonho (sépia) por toda parte, e um prolongado canto de cigarras a ciciarem, elegem o canto da última sabiá buscando no ninho, o aconchego dos filhotes.

Agora a calmaria quase me mata e morre em meu silêncio, sou como uma prece que faço sem dizer palavra, apenas com o olhar quase em mantra, me aquieto também.

Não fico triste, mas a estes momentos, guardo um sentir tão profundo, um respeito de quem vê a mãe no abraço do anoitecer. E penso com um sorriso de felicidade em tudo que permanece como está, mesmo quando não estou por cá.

Puxo uma cadeira e sento-me, agora estou no meu abandonado jardim. As flores andam desbotadas e tão frágeis, como quem sente falta dos olhares que as faz serem belas. O jasmineiro morreu, as orquídeas resistentes aguardam uma nova primavera. Uma taça de vinho, quem sabe outra…

A natureza desnuda com desvelo e graça as fruteiras do quintal e um cheiro de folhas molhadas, pela última chuva, anuncia um novo outono; tudo é como antes e nada é igual.

Olhei, buscando algumas imagens, como quem garimpa uma pepita de saudade. Ela está em toda parte, onde todos os detalhes estão postos como num cenário projetado para sonhar.

(Ednar Andrade).


Lúdibre


A vida?
Já não me engana.
Ela é uma cama de espinhos,
Onde deitei meu corpo são
E despertei chagas e medo.
A vida?
É um espelho que ilude e brilha
Ludibria
Poção viscosa de morte.
Taça doce de veneno e fel.


(Ednar Andrade).

Quietude


É como um vago que não habito
E estou.
É como um riso que choro
E dou.
É como a quietude…


(Ednar Andrade).

(In-Sanidade)


Bendita a loucura
Que rasga meus poros
E o peito
E me derrama
Sobre a mentira real.
Bendita seja
A fome desta agonia
Que, como um bordão,
Ama e maltrata
Noite e dia.
Bendita seja
A insanidade pura
Desta santíssima
Mão vazia.
Sejam benditas, sim,
Todas as sombras
De ti que há em mim.
Que eu coma, respire
E viva louca.
Encontre-me perdida
Sem nunca encontrar a volta.

(Ednar Andrade).

Entardecer...



… Mas tu sumistes
Na multidão dos felizes
E eu debrucei-me a mirar
O pôr-do-sol
Da minha janela.

(Ednar Andrade).

Poema das 24 horas



… É que nos ponteiros de mim,
amanhece,
anoitece.
… Amanhece,
… Anoitece
… Sem hora.

(Ednar Andrade). 

Somos



…Um poema em carne e osso
Mãos carregadas de gritos
Versos; silencioso pranto
Tanta vida, tanto desencanto …
Tu e eu nesta vida.

A vida e nada, além do nada ser;
Somos.

(Ednar Andrade).

Desvarios



Aqui pra nós: ando com as flores meio desbotadas. Por isso tão lenta…….

Mas tudo passa. Desculpe-me as demoras, as paradas da estrada >>>>. Nem tenho escrito, nem reparado nas flores; as pedras, vez por outra, atrapalham os caminhos, machucam nossos pés, ainda mais eu, que costumo pisar descalça pela vida. Me pego com o olhar preso no cinza das chuvas, sem notar que brotam no campo de tantas várias cores; novas flores.

Há um desvario que se faz rumo e quando este fenômeno me acode, destono dos meus acordes, dos meus sons, então como uma valsa descompassada, me desalinho até nos cabelos. E desço mar a fora feito rio fora do leito, acidentando tudo pelas vielas. Deslizo como o lodo e me escondo no verde musgo da minha morada secreta e profunda, sem me suster do risco e dos perigos vastos e paro nas encostas dos meus desabrigos, juntando-me aos veleiros aquieto-me, calo e sonho com o Sol que torna luzente o negro das noites caladas .

Eu sei, alguém já me disse que o meu sem som, chega ser glacial, que meu sem luz, acende o medo e a interrogação, talvez cause espanto, pois tudo que parece abismo me é refúgio no meu habitado mundo de ausentes calendários e remotos vagares.


Para mim, é tão e apenas um inevitável e quente travesseiro, onde deito o corpo cansado e adormeço as ausências de cores.

(Ednar Andrade).