terça-feira, 23 de março de 2010

Johann e Maria (Parte V).


Foto pesquisada na web.

Os dias passavam-se, agora não mais com a lentidão da despreocupação que sempre seguira Johann. A paciência lhe era uma capacidade peculiar, pois sabia que, sendo já um homem casado, embora numa relação conflituosa com Margarete que, ciumenta, parecia vigiá-lo, mesmo sendo educada e fina. Havia naquela mulher um sintoma de posse que o sufocava. Mas, por questões sociais, permanecia no convívio familiar. Margarete, uma mulher bela, com olhos muito claros, robusta, era já sua companheira há quinze anos. Relação que começara nas caminhadas das tardes de outono. Johann conhecera Margarete no período da faculdade. Existia entre eles, além da relação de amigos, uma cumplicidade, não chegava a ser um amor, nunca fora na verdade.

Companheiros de dias e noites, estudando juntos, de pesquisas, saídas com amigos, fez de Margerete e Johann apenas um par que, como amigos, se completavam nas noites de solidão. Ás vezes viajavam juntos. Viagens longas que duravam semanas...  Passeios estes que talvez, por uma conveniência, os levou a casar.

Os dias eram agradáveis... Faziam planos, cresciam juntos. Margarete, mulher inteligente, era uma companheira, digamos, cúmplice desta relação que não envolvia amor e sim uma amizade profunda que, salpicada de momentos íntimos, conseguia perdurar. Desta relação nascera Felipe, filho mais velho do casal, e Tâmara, uma garota bonita que muito parecia-se com o pai. 

Neste contexto, ficava Johann agora a pensar: era como se uma culpa lhe ocupasse todos os minutos a partir daquele instante em que passou a observar Maria. Maria, nome que ardia em seu pensamento, acompanhava-lhe como uma visão que somente o seu olho interno via. Um sobressalto, uma ansiedade.... Olhava para Margarete, sentindo-se infiel, coisa que nunca fora antes, pois sentia-se confortável com aquela situação morna de amigos e amantes. E agora Maria...? Será que seria amor esta inquietude de sua alma? esta paz que lhe faltava, a todo instante? O amor? como seria amar? como seria amar aquela mulher, ora distante? Como seria amar uma mulher nunca tocada por ele antes? Que perfume teria aqueles cabelos esvoaçantes que nas manhãs pintava-se de Sol?

Ainda carregava consigo o perfume que o vento varria até suas narinas, quando o "açoite" trazia até o seu rosto, os cabelos de Maria. Lembra que de sua pele brotava um aroma de jasmim, um floral que não reconhecia... Não sabe ao certo, uma mistura de natureza com os olores matinais do campo

Agora sentia o coração completamente habitado por aquela mulher franzina e delicada. Maria tocava piano, tinha dedos delicados, unhas aparadas pintadas num tom rosa: disto ele lembrava muito bem. Lembrava do balé dos seus dedos, quando lhe pedira para tocar uma música: La vie en rose, que ela tocava com desenvoltura. Agora, porém, suas noites estavam diferentes das de antes do encontro com Maria.

Margarete ficara agora em os seus segundos pensamentos. Não é que não fosse grato e companheiro e cúmplice daquela companheira da mocidade. Mas, sentia que entre eles hoje havia um distanciamento, um desinteresse natural de quem está apaixonado. Agora era preciso falar a verdade a Maria: dizer-lhe do seu sentimento, mas dizer-lhe também de sua companheira. Jamais pensara em transformar um simples apresentação em caso de amor. Era acostumado a ser apresentado a moças tão bonitas e interessantes nos congressos de Medicina. Com que magia o envolveu Maria? Que poder silencioso havia naquela mulher simples que lhe dera apenas um abraço tímido? Achava cedo para tomar decisões, via-se num xeque-mate, no inevitável jogo da vida: o amor. 

Maria, em seu mundo, em sua rotina,  como professora de piano, passou a compor canções que dedicava ao amado. Andava triste, pois já estava sem notícias do amado há alguns meses. Às vezes sonhava com o reencontro, onde pudesse dizer-lhe do amor que sentia. Já era quase noite. Maria fazia uma caminhada nos finais de tarde. Na verdade servia-lhe como terapia e também para inspirar-lhe as canções que compunha. Caminhava sem expectativas. Trabalhava numa rotina diária, onde não tinha tempo para sofrer. Mas, inevitavelmente sua cabeça sentia-se invadida por aquela imagem que carregava consigo: Johann. 

Maria chega em casa, vai até o jardim. Ali fica sentada, olhando o Sol se por. Recosta a cabeça no banco do jardim e fica assim por instantes, quase que cochila. Um pequeno ruído lhe desperta. Alguém toca-lhe os cabelos com gesto já conhecido. Com os olhos ainda fechados tenta adivinhar. Mas, um boa tarde soa-lhe familiar: é Eleonor, amiga inseparável que, assim como quem vem lhe socorrer desta saudade, faz-lhe uma visita.  

 (Ednar Andrade). 


Um comentário:

  1. Ednar Andrade, ao ler o que você escreve,sinto-me rico em conhecimentos gráficos e fico cada vez mais com mente sã em corpo sadio.

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